encerrado
24.09.2009 a 14.11.2009
R. Ferreira de Araújo, 625 - Pinheiros, São Paulo - SP, 05428-001 | São Paulo - Brazil

INTRODUÇÃO

José Antonio da Silva

A obra desse extraordinário pintor foi o ponto de partida para minha paixão pela arte popular, pela arte espontânea.

Nos anos 80, fui conhecê-lo. Ele morava no Cambuci, num apartamento cujas paredes eram forradas por seus quadros. Sem modéstia nenhuma, recebia as visitas dizendo que se considerava um grande artista: ele, Picasso e Van Gogh seriam os grandes pintores do mundo... Tudo era muito autêntico e verdadeiro e tinha muita graça, pois ele era um contador de casos inato e sabia que seu trabalho era bom mesmo. Já tinha sido reconhecido e sua carreira era bem-sucedida. Passei a visitá-lo de quando em quando e sempre saía da casa dele com um quadro embaixo do braço. Era puro encantamento!

Quando nos encontramos, Maria Eugênia e eu percebemos imediatamente que partilhávamos do mesmo sonho, do mesmo ideal.

“Sempre desejei abrir a minha coleção das obras do Silva, nascida do meu amor pela vida simples da zona rural paulista, a um público maior, principalmente o infantil, carente dessa experiência e desse conhecimento”, disse Maria Eugênia, que também chamou a atenção para a necessidade  da preservação da memória da vida no campo.

A ela juntou-se seu filho Álvaro, colecionador de vasos de flores, um tema que o artista passou a fazer em determinado momento da sua vida e nunca mais parou. Generosamente puseram suas coleções à disposição para essa mostra, sem fins comerciais, além dos meios necessários para realizá-la.

Paulo pasta aceitou ser o curador, o que me deu grande alegria!  Trata-se de um artista contemporâneo, com carreira consolidada, além de conhecer pintura profundamente.

Para o projeto educativo, nada usual em galerias de arte, o também artista plástico contemporâneo Claudio Cretti veio agregar ao time sua comprovada experiência nessa área.

Para fechar o grupo dos artistas contemporâneos interessados na produção artística espontânea, Germana Monte-Mór fez o layout e a produção gráfica de todo o material da exposição.

Dessa maneira, o Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro – IIPB - continua, passo a passo, cumprindo sua missão, estabelecida quando de sua criação: divulgar a arte e a cultura da gente brasileira.

Vilma Eid

MAIS INFORMAÇÕES

A obra desse extraordinário pintor foi o ponto de partida para minha paixão pela arte popular, pela arte espontânea. Nos anos 80, fui conhecê-lo. Ele morava no Cambuci, num apartamento, num apartamento cujas paredes eram forradas por seus quadros. Sem modéstia nenhuma, recebia as visitas dizendo que se considerava um grande artista: ele, Picasso e Van Gogh seriam os grandes pintores do mundo... Tudo era muito autêntico e verdadeiro e tinha muita graça, pois ele era um contador de casos inato e sabia que seu trabalho era bom mesmo. Já tinha sido reconhecido e sua carreira era bem-sucedida. Passei a visitá-lo de quando em quando e sempre saía da casa dele com um quadro embaixo do braço. Era puro encantamento! Vilma Eid

curador

Por Paulo Pasta



É conhecida a história da descoberta do pintor José Antônio da Silva.  Três  intelectuais, Paulo Mendes de Almeida, Lourival Gomes Machado e João Cruz Costa, vindos de S. Paulo para a cerimônia de abertura da  Casa de Cultura de São José do Rio Preto, (cidade do oeste paulista, que, naquele ano de 1946, contava com quarenta e cinco mil habitantes), teriam que julgar e premiar os artistas que participavam da mostra coletiva de inauguração.


Paulo M. de Almeida relembra o fato: “ Percorri lentamente o saguão. Em sua quase totalidade, eram telas de um rançoso academismo, cópias de cromos ou de óleo gravuras decrépitas, com flores, pássaros, aves mortas, tachos de cobre, enfim, tudo o que fazia a parafernália da pior seara  dos salões de belas -artes(...)”. Porém, em meio a essa coleção previsível, surpreendeu-o um pintor que “tinha um certo espírito, uma certa graça”, cujas telas, -certamente de um artista primitivo, espontâneo-, assinalavam-se pela  originalidade.  De volta ao hotel,  foi logo dizendo aos seus companheiros de júri:


“ _ Pintor à vista” (2)


O pintor, José A. da Silva, na época com  trinta e sete anos, contrariando  sua família, seu meio social, seu destino de ex-lavrador e atual empregado de hotel, tinha resolvido comprar  tintas, uns metros de flanela , pintar e enviar ao Salão. Dava, desse modo, prosseguimento a uma vocação que  já  se manifestara nos muitos desenhos que traçava desde menino, a maioria tendo como motivo suas  lembranças da vida no campo. As três telas enviadas ao salão eram também testemunhos dessa experiência. Apesar de ser deles o preferido, os  juízes não conseguiram   dar-lhe o  prêmio principal. A comissão organizadora do Salão  anulou o veredito do júri, restando para Silva o quarto lugar.  Mas, depois disso, conseguiram esses intelectuais levá-lo a São Paulo, onde o artista realizou sua primeira exposição individual. Teve todos os quadros vendidos, seu nome no jornal e seu círculo de admiradores ampliado.


Tudo isso marcou de maneira indelével a imaginação do pintor. Talvez tenha sido mesmo,  o momento mais bonito da sua carreira, o seu momento efetivamente glorioso. Coincidiam e cruzavam-se, ali, a descoberta do artista, a confirmação da sua vocação e a possibilidade de superação de sua condição social.


O pintor, que soube responder muito bem a essa oportunidade, também servia, naquele momento, aos anseios de um meio artístico ávido  por um valor autóctone, um valor no qual pudessem  satisfazer e  identificar  a velha questão do que seria uma arte nacional e um artista essencialmente brasileiro. A expressão usada por  Paulo M. de Almeida, “pintor à vista”, também possuía, nessa ocasião, um sentido inequívoco  de “terra à vista”.  O nosso meio demorava-se então nas diluições  de Cézanne e da escola de Paris. Ainda não existiam, como projetos, o Brasil mais moderno dos concretistas nem as Bienais.  Volpi ainda não tinha conquistado, com  a realização das fachadas a têmpera, um plano pictórico mais autônomo.


Penso que esse  desejo de “origem”  viabilizou, no início, o êxito artístico  de Silva, mas,  também, é óbvio que não poderia  explicá-lo por completo. 


Silva, por seu lado,  apoiou-se  muito nessa  noção de pintor primitivo,  não só nos primeiros anos de sua carreira. Inteligente, aceitou-se como o artista que o meio queria ver.   No entanto, se,  por um lado, o epíteto de primitivo  dava-lhe identidade, por outro, cerceava-o justamente no que mais prezava: o progresso da própria obra. Penso que essa contradição acompanhou o pintor durante toda a sua trajetória. Não é raro encontrar nos textos críticos sobre ele argumentos que contestam sua  ingenuidade, sua pureza, justamente porque  sofrera algumas influências, ou porque tivesse resolvido  transformar seu trabalho. Seria o caso, então, de salvar o Silva do próprio Silva?  Não há dúvida, porém, de que,  essa espécie de cobrança mal disfarçava uma ordenação repressiva.


A  esse questionamento, o artista respondia com raiva. Chegou a interromper e a destruir algumas pinturas de uma  série  em que usava uma técnica parecida com o pontilhismo, porque um crítico disse que estava imitando Van Gogh;  pintou telas em que apareciam enforcados os seus  detratores, numa execução em efígie, ou , então,vingou-se  escrevendo impropérios nos vários romances e relatos sobre sua vida.


Apesar desse regime ambivalente, -no qual  o que o nutria também o paralisava-, Silva conseguiu dotar sua obra de um inquestionável movimento, em que está  patente  o artista inquieto que ele era:  sempre aprendeu com suas experiências e  nunca deixou de explorar todos os aspectos que descobria no fazer. Essas  qualidades   tornavam-no autêntico, para além do  simples rótulo  de “pintor puro”. Talvez essa tenha sido   sua melhor resposta, a mesma que responde pela qualidade própria de sua produção.


Theon Spanudis, que, segundo Olívio Tavares de Araújo (3), seria o “inventor” da genialidade de Silva, dividiu o trabalho do pintor em quatro fases . A primeira seria caracterizada pelo uso de cores mais escuras, plúmbeas, densas de mistério. A segunda, iniciada em 1948, sugere já um outro lirismo, dotado de cores mais vivas e claras. A terceira, seria o já mencionado pontilhado, e a quarta, e mais duradoura,  apresenta cores mais cruas e violentas, formas mais ágeis, simplificadas e  concentradas (4). A grande maioria das pinturas dessa exposição são dessa última fase, que , ao meu ver, também seria a etapa na qual  Silva alcança a maturidade e o pleno domínio de sua expressão. 


Apesar de o pintor mostrar-se sempre disposto a incorporar novos temas e até a surpreender  pela   estranheza deles,  os motivos de Silva são também os mais recorrentes da pintura de gênero: paisagens, naturezas mortas, retratos, auto-retratos,flores, assuntos religiosos e alegóricos. Todavia, também podemos reunir  esses temas sobre um pano de fundo comum, que é a vivência de Silva como homem  e trabalhador do campo.  Suas soluções, seus achados  compositivos, suas cores, têm a marca de quem  praticou o que agora representava, pois é notória a intimidade do pintor com os seus temas. E, se Silva retratou o campo em transformação, -a troca da mata pela lavoura, por exemplo-,  essa mesma dinâmica da transformação está, de certa maneira,  metabolizada e processada  na sua maneira de pintar.


Acredito, ainda, que a pintura de José A. da Silva  não possui  a característica  de um simples inventário de usos e costumes. Não tem ela nada de conformista e de simples rememoração. O que faz a sua diferença é justamente um movimento interno, uma vontade de progresso, -e entenda-se aqui progresso como uma pergunta pelo devir do próprio trabalho.  Em  texto conhecido (5), Antonio Candido refere-se a uma dualidade muito presente nos homens do campo, que ele chamou de  “saudosismo transfigurador”. Seria algo como transformar o passado em uma idade de ouro, uma utopia, já que o presente, apesar de trazer alguns benefícios, estaria sempre identificado com uma noção de crise, na qual os valores de sua cultura estariam sob ameaça.


Silva às vezes escreve em seus quadros palavras de sentidas lembranças. Seus assuntos também  se referem, na sua maioria,  a uma época já passada. Mas, parece-me,  isso fica ainda muito restrito ao universo do tema.  Ele tinha, de fato,  uma necessidade muito grande de narrar sua vida e seus feitos, o que realizou em vários livros. É justamente a diferença entre seus livros e seus quadros que ajuda a esclarecer o aspecto em questão.  O que quero dizer é que, quando Silva pintava, ele o fazia no presente e, -se posso dizer assim-, também dotava seus trabalhos de um “presente“.  Ele identificava-se muito com Van Gogh e gostava muito dos expressionistas. Suas cores e sua fatura possuem uma notável presença e podem revelar essa influência. Francas e luminosas, elas são também protagonistas, ajudam a dar o sentido do que está sendo pintado.  Suas soluções formais obedecem ao espaço planar do quadro, têm autonomia e não são subservientes ao assunto. É  curioso notar como ele vai progredindo com suas pesquisas nessa direção. Ele serializa e repete alguns elementos da pintura, carregando-os de um sentido ambiguamente abstrato. Tem uma intuição muito afiada  para perceber a autonomia  plástica das formas, e a exemplo de Volpi, também sabia transformar os conteúdos  figurativos em esquemas mais simples. Sua maneira de pintar as matas e as nuvens, por exemplo, mostra isso.  As queimadas e plantações de algodão, também. (A  própria necessidade de desdobrar seus temas em séries constituía   outro aspecto desse distanciamento do tema). 


As paisagens das plantações de algodão estão, no meu entender, entre suas melhores realizações.  Quando as vi pela primeira vez, lembrei-me das  paisagens de Guignard, aquelas das montanhas e igrejas de Minas, onde   o pintor parece querer reunir céu e terra. 


 


Nas pinturas de Silva, essa construção visionária ganha uma inflexão muito particular. Os longos fios esbranquiçados das “ruas”  do algodoal estão plantados sobre os restos da mata extinta. Sobram dela apenas os troncos, queimados e decepados. Estes são escuros, estão deitados por terra e conduzem à sugestão clara da morte.  As fileiras do  algodoal, que  não os escondem, convergem em perspectiva para o alto da tela onde encontram-se com o céu e as nuvens, e terminam por se confundir com eles.  Por um momento, -olhando para esse ponto do quadro-,  temos uma sensação  de plenitude, de estarmos habitando uma dimensão perdida. Essa unidade espaço -temporal, materializada na tela, sugere agora um modo também de ressurreição. E,  mais uma vez, podemos constatar  que as transformações do mundo, para o pintor, não tinham apenas o sentido de lamentação.


O  universo do trabalho está presente na quase totalidade da obra  de Silva. As personagens de seus quadros estão sempre entregues a algum tipo de ocupação. Todas parecem estar em movimento,  mesmo nas horas de lazer. Assim é também nas naturezas mortas. Há várias delas nas quais essa ação é marcada pela presença inesperada de uma faca,  que, junto dos outros elementos, parece  sugerir que nada estaria, ali,  posto a salvo.


Volpi tinha, pendurada no  atelier, uma dessas naturezas mortas de Silva.  É uma melancia, cujas extremidades foram cortadas, como também o seu centro, de onde uma grande fatia foi retirada. É uma pintura de composição  surpreendente. As partes cortadas e retiradas da melancia estão expostas junto da fruta, assim como a faca, uma presença ameaçadora. No centro da melancia aparece a grande fenda feita pelo corte.  O quadro nada possui de vida  imóvel. Para o artista, parecia não importar apenas a fruta, como sugestão de artefato compositivo , mas exibir as possibilidades de transformação dos objetos. E essa pintura também oferece outras possibilidades de leitura. Além de lembrar o mesmo ritual de morte que mencionei na série dos algodoais, apresenta também uma   clara alusão ao universo da sexualidade,  tanto na presença  da faca, -o instrumento da ação-, como na  fenda aberta por ela. Nesse sentido, podemos  entender também  a predileção do pintor  por  Picasso, que para ele formava, com Van Gogh, a dupla de mestres preferidos.


Outro recurso  plástico muito utilizado por Silva é  o da repetição de alguns elementos que compõem a pintura. Quando desenhava uma boiada, por exemplo, repetia esses bois numa  fila interminável. Fazia o mesmo com as suas seqüências de casas. Estas se repetiam, grudadas, diminuindo de tamanho até o infinito. Os trens tinham os vagões multiplicados por toda a extensão da tela. As procissões também perdiam-se no horizonte. Esse recurso acentuava ainda mais o caráter expressivo de suas composições, numa espécie de hiperbolização do real. Seria algo como transcender o real justamente por querer ser muito realista. Muitas das figuras de suas telas erguem as mãos para o alto. Desesperadas ou  clamando aos céus, como se precisassem desse exagero do gesto para exprimir melhor as circunstâncias a que estavam entregues. A esse desejo de eloqüência, penso eu, para além de ser um potente expediente criativo, correspondia uma enorme necessidade de atenção, vinculada ao desejo de reconhecimento   de suas qualidades de artista.


Os trabalhos apresentados nesta exposição podem atestar a presença de muitos dos traços indicados acima. Esta não é uma mostra que pretenda esgotar a totalidade do universo poético do pintor, mesmo porque a escolha dos trabalhos   ficou circunscrita a apenas quatro coleções. Ela está apta, entretanto, para a intensidade criativa de Silva, bem como indicar a sua riqueza de conteúdos.


Dos temas que comentei acima, apenas os algodoais estarão presentes, mas será possível observar seu apego às  repetições  e ao exagero dos gestos nas inúmeras paisagens e cenas de costumes. Das naturezas mortas, estarão expostos vários dos famosos vasos de flores, ( uma das coleções possui praticamente apenas essa modalidade de gênero). Mas será revelador notar, também  nessas flores, um certo desapego nostálgico. Elas possuem uma clara materialidade,  trazem a carnalidade da tinta para o plano da tela,  oferecendo-se a nós como uma  espécie de convite, uma celebração do  presente.


Uma outra pintura em exposição ( na verdade, mais um desenho sobre tela) mostra  um ambiente que deveria ser  o de um atelier, -mas de fato não é, pois existem urubus voando no céu-, onde um cavalete, que  exibe uma pintura de paisagem de Silva, é vista por uma multidão de seres bizarros.  Tudo  se transforma  em  uma  encenação, como em uma fábula: o pintor parece ter convocado seus interlocutores,- muitos deles com os olhos vendados-, seus fantasmas e  personagens (incluindo os animais), para uma espécie de julgamento da própria obra.  As criaturas, nessa   curiosa reunião, parecem agora observar quem sempre os observou. Será que Silva estaria, aí, parodiando a ocasião em que lhe fora recusado  o primeiro prêmio? 


Detendo-me nessa pintura, não consegui deixar de me lembrar da famosa tela de Courbet, ”Meu atelier”, onde o pintor, ( presente também na cena), realiza  uma celebração, uma alegoria de  sete anos da sua vida artística, fazendo igualmente, do   seu estúdio,  um laboratório da própria obra,  ou seja, um testemunho inesperado do real.


A tela de Silva , -não preciso dizer-, guarda todas as distâncias daquela do famoso autor francês, mas também é ela um testemunho de sua capacidade de estender  os limites do real, em um curioso movimento pelo qual o pintor, afastando-se,  parece entregar-se à dúvida e à auto observação, em um exemplo raro, em sua obra, da aparição da pergunta  pelo o que é real e o que é representação . Talvez, deva-se a  isso, também, a execução mais gráfica e analítica, sem a profusão da tinta e das  cores.


Lembrei-me, também, olhando para essa tela, de um outro texto de Antonio Cândido, -na verdade o prefácio que o crítico escreveu para o romance “Maria Clara”, de Silva. Ele diz: “Nesse livro encantador e autêntico,  o leitor encontrará muitos traços que marcam os quadros admiráveis de Silva. Como neles, há um contorno nítido das coisas, que entretanto mal contém a explosão da fantasia. Como neles, esta é tanto mais forte quanto menos procurada, -isto é, quanto mais o artista se aplica numa transposição meticulosa, que se torna invenção a cada passo. Não pensemos portanto em documento, mas na vida em ritmo criador”. (6)


Penso que, de fato, o mais importante em Silva foi sua capacidade de dotar  a vida desse mesmo “ritmo  criador”.   É impossível , frente às suas pinturas, não notar  essa sugestão de metamorfose, como também sua dinâmica expressiva, capaz de atualizar as forças que agiam no presente. Isso não significa, portanto,  que o artista possuísse alguma fé ingênua no ritmo do mundo. Como bom caipira, era muito desconfiado. Com o mesmo engenho com que elaborava isso em pintura,  também escreveu com argúcia: “ (...) Então, a nossa terra é um globo redondo, -entendeu? - aparado no ar. E aparado por quem? Por nada. Então, não existe um nada, não pode existir um nada, é porque não tem nada. E, se não tem nada, tudo é nada, entendeu? “  (7)


                                      *              *             *                                                                                 


Dependesse da avaliação do próprio José A. da Silva, ele seria um dos maiores pintores brasileiros. Todos que o conheceram, ou mesmo que tiveram alguma aproximação com seus escritos, romances e entrevistas, sabiam da sua inspirada falta de modéstia. Dizia ele que, se todos concordavam sobre a sua genialidade, seria burrice sua não concordar com isso também. Mitologias à parte, talvez esse  juízo o tenha ajudado a pintar como pintou: muito. Mas de maneira desigual.  Uma exposição ideal sobre sua obra seria aquela que conseguisse “limpar” o excesso com que ele próprio se manchou. Não poderá ser a ambição desta pequena mostra. Mas espero que ela desperte o eco , -em quem ainda não  conheça direito a pintura de Silva-, daquela expressão usada por  Paulo Mendes de Almeida: “pintor à vista!”


Notas:


1- José A. da Silva. Catálogo da mostra individual na Casa Grande Galeria de Arte. São José  do Rio Preto. 1976. Texto reproduzido no livro “Silva: Quadros e Livros”. de Romildo Sant’Anna. Editora Unesp, 1993.


2- Paulo Mendes de Almeida. Folha de São Paulo, 22. 2. 1976. (Artigo reproduzido no livro de Romildo Sant’Anna).


3- Olívio Tavares de Araújo. “Silva”. Catálogo da exposição retrospectiva. Pinacoteca do Estado de São Paulo. 1998.


4- Theon Spanudis. “José Antônio da Silva”.Helmut Krüger Verlag. Düsseldorf. Distribuição, Livraria Kosmos Editora. 1976 


5- Antonio Candido. Literatura e Sociedade. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1965.


6- Antonio Candido. Prefácio  a Maria Clara, de José A. da Silva. São Paulo, Duas Cidades. 1970.


7- José A. da Silva. Citado por Emanoel Araujo  em “Silva”, de Olívio Tavares de Araújo, catálogo da retrospectiva da obra do pintor. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 1998


 


 

RELEASE

Apresentar um conjunto de pinturas de José Antônio da Silva (Sales de Oliveira/SP, 1909 – São Paulo/SP, 1996) representativo e pouco conhecido do público é o objetivo desta exposição organizada pelo Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro, na Galeria Estação. Com curadoria do também pintor Paulo Pasta, a mostra reúne 40 obras provenientes de quatro coleções particulares. Os trabalhos compõem um panorama que enfatiza a última fase da produção do artista, imortalizado por potencializar arte de raiz no circuito erudito, conquistando a partir da década de 50 várias edições da Bienal de São Paulo e da Bienal de Veneza (1952 e 1966). Silva foi trabalhador rural no interior paulista até tornar-se artista reconhecido, ao ser descoberto pelos críticos Paulo Mendes de Almeida, Lourival Gomes Machado e João Cruz Costa, em um salão, na inauguração da Casa de Cultura de São José do Rio Preto, em 1946. Dividida em quatro fases, a sua obra apresenta variações no uso das cores e técnicas e um nítido e sistemático avanço ao longo do tempo. A exposição focaliza a quarta fase, a mais duradoura na qual Silva, segundo o curador, atingiu a maturidade e o pleno domínio da expressão ao usar cores mais cruas e violentas, formas mais ágeis, simplificadas e concentradas. Para Pasta, as cores e a fatura são protagonistas das telas francas e luminosas do pintor e ajudam a dar o sentido ao que está sendo pintado. “Suas soluções formais obedecem ao espaço planar do quadro, têm autonomia plástica, não são subservientes ao assunto e, a exemplo de Volpi, Silva também sabia transformar os conteúdos figurativos em esquemas mais simples”, afirma. Com um traço primitivo, espontâneo e original, seus motivos sempre foram os mais recorrentes da pintura de gênero: paisagens, naturezas mortas, flores, retratos, autorretratos, temas religiosos e alegóricos. Segundo o curador ainda, as telas de Silva revelam a sua própria vivência no campo, a paisagem, o trabalho, sempre em busca do progresso, tanto para o campo quanto para a sua pintura. Para esta exposição, o Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro e a Galeria Estação desenvolveram com o artista e educador Claudio Cretti um projeto educativo, composto de material complementar e visitas orientadas.


Para informações e agendamentos: contato@iipb.org ou pelo telefone 11.3813-7253, de segunda a sexta, das 11h às 19h e sábados, das 11h às 15h.


Já no dia 30 de outubro, às 20h, na Galeria Estação, haverá um encontro de Paulo Pasta e Romildo Sant’Anna aberto ao público.


Informações à Imprensa Marcy Junqueira – Pool de Comunicação marcy@pooldecomunicacao.com.br Fone: 11.3032-1599 Fax: 11. 3814 -7000

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