Josef Hofer
Ouvi falar de Josef Hofer por meus amigos na Europa e nos Estados Unidos, onde ele é um artista muito conhecido. Vocês estranham que aqui não seja? Pois é, é nessas horas que ganha pontos minha tese de que a arte é regional. Como pode alguém ser conhecido no hemisfério norte, e no sul, não? Acontece.
A história e a obra do artista plástico Josef Hofer se encaixam na Art Brut, segundo Jean Dubuffet, pintor francês que nos anos 50 escreveu um manifesto sobre a Art Brut, lançando luz sobre esse assunto tão discutido e controverso.
Nascido na Áustria, surdo e mudo, com uma deficiência mental, Josef Hofer morou em residências psiquiátricas na própria Áustria, que cuidam, por meio da arte, de pessoas com problemas semelhantes ao dele. Já adulto, teve a sorte de estar na hora e no lugar certo, quando a dra. Elisabeth Telsinik trabalhava em uma dessas instituições.Aí começa a história de reconhecimento do talento e de acompanhamento de Josef Hofer, até que ele se tornasse um grande artista.
Sua primeira exposição individual foi na Suíça, no Musée d’Art Brut de Lausanne, criado graças a Jean Dubuffet, que doou a ele toda a sua coleção de Art Brut. A esta sucederam muitas outras, em instituições e galerias comercias de vários países.
Dra. Elisabeth mora em Salzburgo, pequena e charmosa cidade da Áustria onde acontece anualmente um festival de música de verão, ao qual tenho o hábito de ir. No ano passado, escrevi a ela e fui conhecê-la. Ela é a curadora nomeada de Josef Hofer, cuida dele e de todo o seu acervo. Fiquei fascinada com o trabalho de Hofer e não resisti. Decidi ali mesmo que não era justo que nós, brasileiros, não conhecêssemos este desenhista excepcional.
Surpreendam-se!
Vilma Eid
Josef Hofer 09 de Setembro - 19h - Abertura | 3o andar Exposição até 09 de Outubro de 2019 Galeria Estação
Josef Hofer
Elisabeth Telsnig
(Tradução: Otacílio Nunes)
“Arte não é um acessório bonito – é o cordão umbilical que nos liga ao divino. Ela garante nossa humanidade.”1
A vida não legou a Josef Hofer o melhor começo nem os melhores pré-requisitos. Mas desde o início ele foi desafiante, e bravo. Foi e é uma pessoa curiosa e inquisitiva que anseia com muita antecipação pelo que a vida ainda pode trazer. Por meio de seus desenhos, ele supera e domina suas deficiências congênitas. Sua arte é comunicativa ao modo dele, muito íntimo, muito excêntrico e singular.
A primeira exposição individual importante de obras de Josef Hofer foi realizada em 2003, na auspiciosa Collection de l’Art Brut, em Lausanne, Suíça. A ela se seguiram outras, na Áustria, Alemanha, França, Mônaco, Holanda, Bélgica, Inglaterra, Suécia, Dinamarca, Itália, Espanha, Portugal, Polônia, República Checa, Eslováquia, Estados Unidos, Japão, e agora Brasil. Suas obras estão representadas por todo o mundo em importantes coleções e museus de Art Brut. Hoje ele é considerado um “clássico” da Art Brut.
Josef Hofer nasceu no fim da II Guerra Mundial, em 17 de março de 1945, em Wegscheid, Bavária. Sua mãe (1909-1999), que na época tinha 36 anos e era considerada uma “grávida tardia”, queria viajar para o hospital na cidade austríaca de Linz para lá fazer o parto. Mas isso não foi possível devido aos pesados bombardeios. Então ela atravessou de carro a fronteira alemã até o hospital mais próximo. Durante o “Terceiro Reich”, e na verdade até agosto (!) de 1945,2 esteve em vigência na Alemanha a Lei para Proteção da Saúde Genética do Povo Alemão, que exigia que médicos e parteiras relatassem imediatamente o nascimento de uma criança deficiente. As consequências eram a morte do recém-nascido e a esterilização pelo menos da mãe. O pequeno Josef foi muito afortunado, porque, embora suas necessidades especiais fossem visíveis desde o início – ele era física e intelectualmente deficiente –, nada foi informado às autoridades de saúde.
Os pais já tinham um filho, então com 5 anos. O pai (1905-1977) era torneiro de madeira e fabricante de tubos. Como ambos os filhos eram intelectualmente deficientes, o pai desistiu de sua profissão e comprou uma pequena fazenda em St. Johann/Wimberg, na região austríaca chamada Muehlviertel, esperando que os filhos pudessem um dia operar a fazenda e desse modo ganhar a vida. Os pais percebiam o perigo mortal que espreitava no “Terceiro Reich” para aqueles rotulados de “vida indigna de ser vivida”.3 A irmã mais velha do pai, Luise Hofer (1879-1941), mudou-se para Wiesbaden como empregada doméstica quando era jovem, desenvolveu esquizofrenia e, a partir de 1925, viveu em várias instituições psiquiátricas. Ela foi vítima da “Eutanásia”4 nas câmaras de gás em Hadamar, em 1941. Depois de 1945, a Áustria foi dividida entre as quatro forças de ocupação aliadas, Estados Unidos, Inglaterra, França e Rússia. A área em que a família de Josef Hofer vivia permaneceu ocupada por tropas russas de 1945 a 1955. Em consequência das experiências da família e da situação política, os pais isolaram o filho mais novo, que ficou na fazenda e nunca frequentou uma escola.
A casa carecia de higiene, não havia eletricidade nem água corrente. Josef ficava frequentemente doente, tinha dentes ruins e graves infecções no ouvido interno que levaram à perda quase complete de sua audição. Como nunca aprendeu a usar a linguagem como ferramenta de comunicação, para se expressar ele emitia sons guturais e, mais que tudo, um amplo conjunto de gestos. Seu extraordinário talento para o desenho tornou-se aparente muito cedo, ainda durante a infância. Seu irmão mais velho trazia lápis e tocos de lápis de cor da escola para casa. Uma folha de jornal costumava ser usada como superfície.
Com a morte do pai, a mãe ficou sobrecarregada com o sustento dos dois filhos, então se mudou com eles para Kirchschlag, perto de Linz, onde recebeu algum apoio de uma sobrinha, Renate Sager. A sobrinha tinha três filhos, que se tornaram companheiros de brincadeiras de Josef. Renate Sager assumiu a guarda de Josef e seu irmão durante muitos anos.
A partir de 1985, Josef foi levado durante o dia à Lebenshilfe em Grein e Linz, e em 1992 à Lebenshilfe em Ried im Innkreis, que é onde ele vive hoje. A Lebenshilfe é uma organização social para pessoas com deficiências físicas e intelectuais. Conheci Josef em 1977 no ateliê da Lebenshilfe, que supervisionei em Ried até 2015. Cerca de trinta pessoas participavam de meu ateliê, entre elas Josef, e notei de imediato seus desenhos. Eles eram diferentes de qualquer coisa que eu já tinha visto. Logo comecei a recolher os primeiros desenhos modestos dele em resmas de papel para computador, e organizá-los em um inventário e, acima de tudo, conseguir o espaço livre apropriado para Josef e suas as atividades artísticas. Eu me esforcei muito para garantir que ele pudesse desenvolver seus dons por conta própria. Ele devia poder trabalhar com o máximo de autonomia possível. Em suas primeiras folhas, Josef costumava retratar objetos que refletiam a vida na fazenda, como tratores, implementos agrícolas ou máquinas de construção. Muitas vezes ele desenhava objetos que faziam parte de seu ambiente doméstico, como mobília ou suas roupas. Em desenhos ele registrava acontecimentos especiais, como passeios, festas de Natal ou suas sessões de equoterapia. Sempre que desenhava figuras, ele primeiro as fazia a lápis nuas e depois acrescentava a elas as roupas, camada por camada, com frequência cobrindo-lhes o rosto como se com um capacete de proteção, de modo que as figuras acabavam parecendo estar dentro de uma armadura. Por outro lado, ele rabiscava cenas eróticas muito reveladoras, semelhantes a uma erupção, em um pedaço de papel com corpos nus que eram contorcidos ou muitas vezes enredados um no outro. Essa ambivalência aponta, por um lado, para o autismo em que ele se retirou com base em sua perda auditiva e, por outro, para suas fantasias e desejos, que ele conseguia expressar por meio do desenho.
Um acontecimento definitivo para Josef ocorreu em 2000, com a compra de um espelho, medindo um metro quadrado, que ele colocou no chão de seu quarto e com o qual podia agora observar a si mesmo por horas a fio. Na visão espelhada, ele reconheceu seu “alter ego”, que então reproduziu em numerosos desenhos eróticos. No ato de obter e possuir o espelho, combinado ao encontro com o próprio corpo, Josef Hofer experimentou a descoberta de seu eu, sua sexualidade. Essa descoberta foi registrada nos inúmeros nus que mostram o surgimento de sua autoconsciência. É bastante apropriado referir-se a isso como a “fase do espelho”, termo usado pelo psicanalista francês Jacques Lacan. Lacan descreve aqui a fase de desenvolvimento de uma criança no momento em que ela pela primeira vez vê completamente sua imagem e se encontra e se experimenta como “eu”. O desenvolvimento intelectual e emocional de Josef Hofer certamente se atrasou consideravelmente. No ato de obter e possuir o espelho, combinado ao encontro com o próprio corpo, ele experimentou a descoberta de seu eu, sua masculinidade, e como resultado recriou essa descoberta em seus desenhos. Os autorretratos de Hofer marcam o surgimento de sua autoconsciência.
Se a princípio os objetos e pessoas eram desenhados de maneira isolada, a partir de 2003, Josef começou de repente a cercar seus desenhos com uma moldura amarela-laranja, criando a impressão de que desse modo desejava protegê-los. A moldura tornou-se uma obsessão que o envolvia por muitas horas, primeiro usando um lápis com a ajuda de uma fina faixa de piso de madeira, depois preenchendo o padrão geométrico sempre com os mesmos tons de cor – de amarelo e laranja. Desse modo, eram criadas autênticas formas arquitetônicas, cheias de profundidade, perspectiva e sentido espacial. Enquanto eu observava, podia reconhecer quão exatamente e conscientemente ele sempre planejava cada estágio de trabalho. Josef havia trabalhado durante anos na oficina de tecelagem da Lebenshilfe, e o ir e vir do processo de tecelagem parece ter sido gravado como uma imagem em sua memória. Essas magníficas construções de moldura amarela-laranja refletem o autismo de Josef Hofer, as barras protetoras de sua alma, da qual ele permite a nós, espectadores, espiar uma pequena porção, como se através de uma janela. Desde 2014, as molduras se tornaram mais finas e Hofer preencheu frequentemente o fundo com as letras de seu apelido, “PEPI”.
Josef Hofer sempre trabalhou dentro de uma série. Quando está fascinado com um motivo, ele o desenha repetidamente, quase obsessivamente, às vezes apenas com mínimas variações, até chegar ao que considera o quadro perfeito. Sempre que alguém o observava em seu trabalho, da maneira mais discreta possível, tinha a impressão de que ele tentava capturar o motivo, em busca do desenho ideal, da imagem perfeita. Só então ele conseguia avançar para um novo motivo.
A capacidade de se expressar e comunicar sobre seus desenhos tem grande importância para Josef Hofer. Como não pode ouvir nem se fazer entender verbalmente, ele se comunica com o mundo exterior por meio de sua arte. E consegue fazer isso com grande expressividade, competência e facilidade cativante. Ele está envolvido criativamente consigo mesmo e com seu corpo e, assim como no modo como está envolvido com seu reflexo no espelho, ele se envolve igualmente com as posturas e posições do corpo representado, e supera, ou até mesmo triunfa sobre sua deficiência através corpos que desenha.
Talvez seja nesse envolvimento com os corpos e posições representados, e com as formas e repetições obsessivas, mesmo em grau excessivo, que se possa encontrar certa prova da afinidade de Hofer com o trabalho de Egon Schiele (1890-1918). O livro de Jane Kallir intitulado Egon Schiele. drawings and watercolours foi dado a Hofer em 2007, e ele costumava ficar debruçado sobre ele durante incontáveis horas, totalmente mesmerizado. Josef tirou dele alguns motivos e os interpretou vezes sem conta, a seu modo. Pode-se dizer que ele se encontrou até certo ponto na arte de Egon Schiele. Ele descreve as formas e gestos característicos de Schiele, mas permanece fiel a si mesmo em termos de estilo.
Na literatura austríaca, Arthur Schnitzler (1862-1931) foi o primeiro a implementar deliberadamente o chamado “monólogo interior” em seu romance Fräulein Else (1924). “Monólogo interior” significa que uma figura literária se dirige a si mesma diretamente. Descobrimos esse “monólogo interior” na arte da pintura com os autorretratos de Egon Schiele. Na Art Brut, Josef Hofer continua a conduzir esse diálogo consigo mesmo. Em seus autorretratos, ele também inclui o observador no quadro. Parece que o observador está na frente do espelho em vez de Hofer e olha para o quadro – o autorretrato de Hofer.
Um desenho a lápis de Egon Schiele de 1910 intitulado Schiele com modelo nu diante do espelho5 (ver figura 1) mostra as costas de um nu feminino com um chapéu no fundo; do lado esquerdo, em um espelho imaginário, o nu é visto de frente, e atrás, à esquerda – também no espelho imaginário –, está o autorretrato do artista sentado. A vista de frente e simultaneamente a vista de costas de uma figura em um único desenho podem ser encontradas também em Josef Hofer. O ato criativo, contudo, é completamente diferente. Nesse desenho Schiele utiliza o espelho imaginário como uma ferramenta e tenta reproduzir uma situação real. Hofer dispensa essas ferramentas, ignora a chamada realidade e desenha as vistas de frente e de costas em uma única figura. Josef Hofer desafia qualquer tipo de lógica. Ele nem sequer tenta retratar a aparência exterior real. O que ele oferece em suas representações é como ele sente e experimenta fisicamente as figuras e os objetos. Devido a sua surdez, Hofer recorre a outro modo experimental por meio da orientação espacial. Os corpos que ele retrata exibem tal dinâmica de movimento que podem com frequência ser vistos como maneiristas. As vistas de frente e de costas se fundem, como um rosto com a visão de trás da cabeça ou o corpo de um homem com o de uma mulher. Ele funde os dois em um, em figuras andróginas. Se os corpos, objetos ou letras são invertidos, de trás para a frente, não tem nenhuma importância para ele. Se há heterossexualidade ou homossexualidade não o preocupa em nada, já que ele faz isso com inocência e absolutamente livre de intencionalidade. Desse modo, ele rompe com todas as tradições ocidentais. A representação de suas figuras é inteiramente diferente de qualquer coisa feita antes – é engenhosa e, sim, revolucionária. Josef Hofer desenvolveu seu próprio sistema para se apropriar da arte e estabeleceu novos padrões para a representação figurativa. Ele alcançou uma implementação simbólica sensual do desenho figurativo.
Josef Hofer tem mais de 74 anos e hoje só desenha de vez em quando.
Notas
1 Nikolaus Harnoncourt (1929-2016), maestro, celista e autor de música austríaco, pioneiro no campo da prática de performance histórica.
2 A Segunda Guerra Mundial terminou em 8 de maio de 1945, depois da capitulação incondicional das forças armadas alemãs.
3 O regime nazista rotulava como “vida indigna da vida” seres humanos com defeitos cognitivos e físicos, com doenças genéticas, homossexuais, entre outros. Binding e Hoche cunharam o termo em sua brochura “Autorizando a destruição de vida indigna da vida, sua medida e sua forma” (Leipzig, 1920).
4 “Eutanásia", destruição da “vida indigna da vida” e os assassinos nazistas de pacientes psiquiátricos, também conhecidos como “Action T4”. O nome “Action T4” foi inspirado no escritório central do departamento da Chancelaria montado pelo Führer em Berlim, localizado na Tiergartenstrasse 4. Ele foi responsável pela organização de crimes de “Eutanásia” de 1939 a agosto de 1941. A descrição “T4” não é um termo de camuflagem cunhado pelos nacional-socialistas, mas uma expressão usada durante os anos do pós-guerra.
5 Egon Schiele (1890-1918), Schiele com modelo nu diante do espelho, 1910; lápis sobre papel de embrulho, Albertina, Viena, nº de inventário 26276.
Fig 1
Egon Schiele (1890-1918), Schiele com modelo nu diante do espelho, 1910; lápis sobre papel de embrulho, Albertina, Viena, nº de inventário 26276.
Galeria Estação
Apresenta
Individuais de Fernando Diniz e Josef Hofer, artistas cujas divergências da mente e do corpo não encontram limites na arte
Abertura 9 de setembro, às 19h – 09 de outubro de 2019
A duas mostras são desdobramentos do Seminário Internacional “A arte como construção de mundos", que acontece paralelamente à mostra “Bispo do Rosário: As coisas do mundo”, na Fundação Marcos Amaro, em Itu, dia 07 de setembro, evento apoiado pela galeria Estação que traz como uma das palestrantes a Dra. Elisabeth Telsnig, tutora da obra de Josef Hofer e curadora da exposição do artista em São Paulo.
Fernando Diniz (1918, Aratu, Bahia – 1999, Rio de Janeiro, RJ) está entre os artistas forjados no ambiente da Dra. Nise Da Silveira, hoje reunidos no Museu de Imagens do Inconsciente, instituição parceira da Galeria Estação na realização desta individual em sua homenagem. Com curadoria de Luiz Carlos Mello e Eurípedes Junior, a mostra institucional traz um recorte de pinturas da produção de Diniz estimada em cerca de 30 mil peças, entre telas, desenhos, tapetes e modelagens. Com sua obra tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 2003, o reconhecimento do artista é ainda saudado pelas inúmeras exposições no Brasil e no exterior, prêmios, publicações, filmes e vídeos.
“Não sou eu, são as tintas”, esta era a sua resposta, quando frequentava, a partir de 1949, a Seção de Terapêutica Ocupacional do Centro Psiquiátrico Pedro II, criado por Dra. Nise. Segundo os curadores, Diniz mescla o figurativo e o abstrato, abarcando das mais simples às mais complexas estruturas de composição. “Presença constante é o geometrismo, marcado muitas vezes pela imagem do círculo, que representa as forças ordenadoras, curativas, da psique”.
Além de ter produzido intensamente – de quatro a seis trabalhos por dia –, Fernando Diniz recolhia todo tipo de papel que encontrasse no hospital e em suas cercanias, levando-os para o seu quarto. Ali, utilizava esses materiais como suporte para suas criações, denominando-as “Reciclados”. Velhos lençóis lançados ao lixo pela administração hospitalar foram recuperados por ele: costurando-os, construiu suportes para as pinturas de grandes dimensões que denominou Tapetes digitais.
Os curadores destacam a ânsia por conhecimento do artista, que chegou a imaginar o hospital como uma universidade. “A sua paixão pelos livros fazia-o constantemente atualizado com os acontecimentos e descobertas científicas. Manifestava interesse por astronomia, química, física nuclear e informática, revelando-se um pesquisador incansável”. Sua curiosidade pelo conhecimento levou-o ao cinema. Foi a sua participação no filme Em busca do espaço cotidiano, de Leon Hirszman, que despertou seu interesse pelo movimento da imagem. Esse interesse resultou no premiado desenho animado Estrela de oito pontas, para o qual criou mais de 40 mil desenhos sob a orientação do cineasta Marcos Magalhães.
Em 1992 o Museu de Imagens do Inconsciente realizou uma grande retrospectiva de sua obra, O universo de Fernando Diniz, ocupando com mais de duas centenas de trabalhos os espaços do Paço Imperial da Praça XV, no Rio de Janeiro.
“Do espaço para o tempo, do inorgânico para o orgânico, do geométrico para o figurativo ou vice-versa, Fernando ia tecendo seu universo. Visitou os espaços interiores da casa sonhada, e as amplidões das paisagens; fragmentou ou reconstruiu o corpo humano, submetendo-o aos movimentos dos jogos, dos esportes; esquematizou objetos e seres, imaginou objetos científicos, executou verdadeiros tornados geométricos prenhes de formas cuja multiplicidade extrema por vezes levou-o ao caos, de onde sempre retornava trazendo novas e inesperadas imagens, como os seus últimos abstratos, onde logomarcas, fórmulas químicas, signos e símbolos se misturam para criar um luxuriante universo de coisas, um inventário do mundo”, concluem Luiz Carlos Mello e Eurípedes Junior.
Josef Hofer (1945, em Wegscheid, Bavária), hoje considerado um “clássico” da Art Brut, tem sua obra conhecida na Áustria, Alemanha, França, Mônaco, Holanda, Bélgica, Inglaterra, Suécia, Dinamarca, Itália, Espanha, Portugal, Polônia, República Checa, Eslováquia, Estados Unidos, Japão e agora no Brasil. Difícil imaginar como artista chegou hoje aos seus 74 anos diante de tantas dificuldades. Começou com seu nascimento, em março de 1945, quando, até agosto do mesmo ano, esteve em vigência na Alemanha a Lei para Proteção da Saúde Genética do Povo Alemão, que exigia a médicos e parteiras o relato imediato do nascimento de uma criança com deficiência. As consequências eram a morte do recém-nascido e a esterilização pelo menos da mãe. Embora suas características físicas divergentes fossem visíveis desde o início, nada foi informado às autoridades de saúde. Mais tarde, isolado com a família em uma fazenda, também com problemas de audição causados pelas inúmeras infeções de ouvido que acabaram afetando também a fala, não pode frequentar a escola, como seu irmão mais velho. Este, mesmo com deficiência intelectual, trazia para casa lápis e tocos de lápis de cor com os quais Hofer costumava desenhar sobre uma folha de jornal. Com a morte do pai, Hofer foi levado pela mãe para Kirchschlag, perto de Linz, onde ficou sob a guarda de uma sobrinha. Desde 1992 vive em Lebenshilfe em Ried im Innkreis. Lebenshilfe,organização social para pessoas com deficiências físicas e intelectuais, onde conheceu a historiadora de arte Elisabeth Telsnig, em 1977. “Cerca de trinta pessoas participavam de meu ateliê, entre elas Josef, e notei de imediato seus desenhos. Eles eram diferentes de qualquer coisa que eu já tinha visto”, afirma Telsnig. “Como não pode ouvir nem se fazer entender verbalmente, Josef Hofer se comunica com o mundo exterior por meio de sua arte. Está envolvido criativamente consigo mesmo e com seu corpo e, assim como no modo como está envolvido com seu reflexo no espelho, ele se envolve igualmente com as posturas e posições do corpo representado, e supera, ou até mesmo triunfa sobre sua deficiência através dos corpos que desenha”, completa.
Elisabeth Telsnig é curadora, doutora em história da arte e chefe do workshop de atividades criativas das instalações comunitárias de Lebenshilfe Oberösterreich em Ried (Áustria), onde Josef Hofer participa semanalmente. Ela é tutora do artista desde 1997.
Sobre Seminário Internacional: “A arte como construção de mundos".
Local: Fundação Marcos Amaro / Itu / 07 de setembro
O encontro – organização ARTE!Brasileiros – tem como objetivo apresentar para o público a enorme riqueza e diversidade de artistas, ex-pacientes psiquiátricos no Brasil e no mundo, ligados ao movimento inicialmente nomeado pelo pintor francês Jean Dubufett como Art Brut, e debater sobre a beleza e a força contida na produção das obras de artistas asilares. Participam do evento Elisabeth Telsnig (representante do trabalho do artista austríaco Josef Hofer), Savine Faupin (curadora-chefe responsável por Arte Bruta no Museu de Arte Moderna, Contemporânea e Arte Bruta de Lille, França), Tânia Rivera (psicanalista, doutora em Psicologia e professora da Universidade Federal Fluminense) e Raquel Fernandes (diretora geral do Museu Bispo do Rosário Arte Contemporânea, Rio de Janeiro). A conversa será mediada por Ricardo Resende (curador da Fundação Marcos Amaro e do Museu Bispo do Rosário Arte Contemporânea).
Informações: jamyle@artebrasileiros.com.br - eliane@artebrasileiros.com.br
Exposições: Fernando Diniz e Josef Hofer
Abertura: 09 de setembro, às 19h
Visitação até 09 de outubro de 2019
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