encerrado
26.07.2011 a 01.10.2011
| São Paulo - Brazil

INTRODUÇÃO

Elisa Bracher

Introdução

Há muitos anos atrás em uma viagem por Minas, desavisadamente cheguei a uma casa no interior, no quintal vi um monte de crianças empoleiradas em cima de um toco, todas elas com ferramentas na mão batendo bravamente contra madeira em um pequeno pedaço de ferro que não chegava a ser formão. De tempos em tempos um senhor se levantava de uma cadeira na varanda, chegava-se ao toco e afetivamente rearranjava as crianças, umas para lá outras para cá alguma observação e as crianças voltavam ao seu tuc tuc.

Não sabia que estava na casa do Artur Pereira.

Espero conseguir falar do que vi e vejo nestas escultura e exposição com a mesma simplicidade com a qual cheguei na casa de seu Artur.

“O que nos vemos da cousas são as cousas,
por que não veríamos nós uma cousa se houvesse outra?
por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos
se ver e ouvir são ver e ouvir?

O essencial é saber ver
saber ver sem estar a pensar
saber ver quando se vê
e nem pensar quando se vê e
nem ver quando se pensa”.

Fernando Pessoa na voz de Alberto Caieiro

 

O Homem

As mãos falam, mexem, cantam, contam, de um mundo que ainda não está.

Não está aqui, lá, acolá. É gesto. É movimento de construir, de dar forma, de unir o bater do coração e o correr do sangue. O tuc-tuc do cavoucar a madeira que aproxima mundos tão distantes.

As mãos resguardam a parte suave do sangue que difere muito daquele que se agita no sol a sol da enxada na terra. Este mundo protegido está para lá muito além destes lugares que os olhos conseguem ver.

Estes gestos repetidos ao infinito aproximam os olhos e ouvidos tornando possível que o mundo guardado no quente do coração construa canais por onde formas e pesos, luzes e sombras materializem percepções.

A lida com a terra, a rudeza dos gestos, o gasto todo do corpo, parecem não eliminar o sentido de doçura do crescimento das plantas, que ficam gravadas na mão de cada escultor.

Todos sabemos da dor de crescer, há a lenda de que o canto da cigarra é um canto de dor. Por que é tremendamente dolorido trocar de casca. Mas gostaríamos de imaginar a alegria do canto da cigarra. A conquista da necessária serenidade para conviver na dureza da lida no campo é potencializada para elaboração de um mundo onírico. Entre o movimento da enxada na terra ária e o bater do formão, da extensão de um campo a carpir ou arar e o toco pleno e compacto solidificam-se sonhos e pensamentos.

Na dureza do dia a dia o cantar diz: “A minha casa fica lá de trás do mundo, onde vou em um segundo quando começo a pensar. O pensamento parece uma coisa a toa, mas como é que a gente voa quando começa a pensar?”. Por trás das mãos duras e cascudas do lavrador, a terra e a enxada moldam a melodia. A mão do artesão é mão de sonho, é mão de um segundo que se expande quando começa a esculpir, o movimento continuo constrói mundos mais sensíveis.

O homem lavrador constrói possibilidades de vida com seu corpo e suas mãos em simbiose com a terra faz o alimento. O homem artista resguarda o imaginário desta lida e constrói um mundo além ou aquém do longo e árduo crescimento das plantas. Na lenda da cigarra e da formiga o artista longo e árduo crescimento das plantas. Na lenda da cigarra e da formiga o artista seria a formiga que armazena sentidos, nuances e sonhos para que no escurecer do dia a fadiga corporal não apague suas mais sutis impressões.

Para esse homem não há muito assunto além do próprio existir. Em sua linearidade poderíamos dizer que há um moldar a terra, ocupar a terra, povoar o tempo. As esculturas me parecem uma forma de resistência, um movimento de sobreposição do humano à natureza. De recusa ao primitivo e tosco, de tirar de cavar, de dar forma, ao mundo e a si próprio como indivíduo.

 

A obra

As esculturas aqui apresentadas guardam semelhanças e diferenças, todas elas executadas em madeira. A maioria constrói-se em círculos e ou repetições. A madeira, o círculo, o movimento repetido das figuras que se sobrepõem ao gesto de cavoucar remetem à origem e à criação do mundo. A historia do homem escultor se prolonga na continuidade dos veios da madeira e no arredondado das formas acaba, por construir um mundo ideal aonde o veio torna-se canal de ligação. Temos uma peça e uma forma composta de muitas imagens, não são diferentes imagens nem mesmo diferentes partes que se unem, mas um único universo arredondado e contínuo como são os dias no tempo desses homens escultores.

A precisão dos gestos e a destreza manual, não se rendem a uma fácil visualidade. As formas construídas com precisão, resultam da relação peculiar com o tempo e a maneira como vivem. É com este gesto que o homem constrói no mundo sua individualidade humana, distinguindo-se da natureza. As formas e o movimento das esculturas se assemelham ao vagaroso repetir do dia após dia. O tempo não é mais do que ele mesmo, monótono e constante como a fila circular de animais que Artur Pereira apresenta, ou o pontilhado humanos das rodas de GTO.    

As esculturas de GTO me lembram o Bosch, no acúmulo de homens, quase estilizados, que parecem lutar por sua individualidade participando de um coletivo onde o movimento criado pela posição das figuras determina o movimento a roda ou da peça toda remetendo ao movimento do mundo.

Num imaginário ideal, aonde muitos homens ligados amigavelmente dividem e determinam uma única peça de madeira, as marcas do enxó ou do formão não são naturais, mas sim um recurso que encobre a delicadeza das figuras e suas relações.

Nas esculturas de GTO e de seu Valdir o gesto tosco se mantém aparente, as formas se revestem do bruto do material. Tal acabamento que se fantasia de não finalizado resulta um ritmo duro e entrecortado.

Diferentemente nas esculturas de seu Artur, os animais, as árvores e os troncos despem-se do grosseiro da madeira e ressaltando os veios, acrescentam força visual a continuidade e ao aspecto onírico de suas peças. Os veios visíveis criam um ritmo de linhas contínuas e suaves.

A madeira aqui fala com suas características físicas mais sensíveis e profundas. Na superfície fala por ela mesma e não pela ação do homem. Em algum lugar, talvez nas feições dos animais ou no comprido excessivo dos corpos, suas esculturas me lembram Chagall com céus aonde figuras, anjos e natureza fazem uma dança como se fizessem existir um mundo a parte.

Mundo a parte que neste grupo de esculturas é um mundo só constituído destas diferentes partes sem peso e medidas individuais.

Nos dois, homens árvores e rodas animais, todos tem a mesma origem e a mesma natureza, esta forma única cria a unidade coesa de um mundo harmônico e amplo, amplo pois nada impediria que estes movimentos se estendessem ao infinito em colunas, no caso de seu Artur, semelhantes as de Brancusi, desta maneira haveria uma união perfeita entre céu e terra, como ideal das relações entre humanos e divindades.

Nas rodas de GTO surpreendem as correntes penduradas, elementos estranhos a todo o movimento criado pelo acúmulo rítmico das figuras humanas que tratam de se equilibrar em comunhão entre os homens, remetem a uma necessidade de brecar o movimento, o tosco da madeira confere tanta força plástica ao conjunto que não admiraria surgir ali um movimento centrífugo que os levasse ao infinito. São homens que se ajudam, cooperam e criam movimento dividindo forças. É um mundo de companheirismo.

Seu Jadir é o mais monoblótico dos três. São figuras que se repetem e dificilmente se separam do toco de madeira. Diferentemente dos outros dois aqui as figuras consideram como parte suas o próprio bloco, a questão me parece mais de apagamento, de tantos homens que vemos, dificilmente iremos tratá-los individualmente. A questão de Seu Jadir é mais de homem para homem, em seus depoimentos foi o cavoucar a madeira que lhe salvou de uma depressão, e sua filha nos conta da emoção que sentiu no momento em que ouviu um tuc tuc e pensou que o coração do pai voltava a bater.

Seu Jadir cria uma legião de homens todos poucos redondos,  são mais formais, aquadrados, menos humanos, mas do mesmo modo que GTO são homens cooperativos que se ajudam na sustentação do peso do mundo ou deles próprios. Em termos plásticos, a forma é o todo, ou seja, é na soma e na ordenação dos rostos que aparece a forma e o peso da escultura.

Em algumas obras seu Jadir detalha mais os rostos, mas eles sempre estão fortemente ligados a uma massa maior que confere peso e uma aparência de bidimensionalidade.

Por fim as colunas de seu Artur onde os animais surgem individualizados. Surgem hierarquias e as árvores ou troncos não são mais do que um elemento plástico buscando independência da figuração. Os animais ocupam lugares diferentes, criando uma estranha espacialidade sem centro nem eixo. O ritmo muda, aliás, não há mais um ritmo pré-estabelecido, a partir dos troncos, o espectador atua, olhar de um lado na é mais quase o mesmo que olhar de outro. Assim, seu Artur me parece se autorizar a inventar suas próprias leis, sua própria origem sobrepondo-se ao movimento natural e previsível das obras redondas. Aqui o escultor ganha liberdade para atuar fora das leias da natureza, é ele mesmo no embate com o imaginário vai até onde o material e o equilíbrio permitirem. 

MAIS INFORMAÇÕES

Escultores Mineiros

Abertura 26 de julho de 2011 a 01 de outubro de 2011
Curadoria Taísa Palhares

curador

Taísa Palhares  - A alma, o olho e a mão: três escultores mineiros


"A observação de um artista pode atingir uma profundidade quase mística. Os objetos iluminados perdem os seus nomes: sombras e claridades formam sistemas e problemas particulares que não dependem de nenhuma ciência, que não aludem a nenhuma prática, mas que recebem toda sua existência e todo o seu valor de certas afinidades singulares entre a alma, o olho e a mão de uma pessoa nascida para surpreender tais afinidades em si mesma e para as produzir." Paul Valéry


Desde o primeiro contato que tive com as criações de Artur Pereira (1920-2003), G.T.O (1913-1990) e Jadir João Egídio (1933), chamou-me a atenção a acuidade de suas respectivas expressões plásticas. Suas esculturas sugerem a intimidade de uma relação que se constrói a partir da observação contínua, lenta e acumulativa das coisas e do mundo.


Ao reuni-los na mesma exposição, buscou-se explorar, mediante o duplo exercício de aproximação e distanciamento, a singularidade de suas complexas esculturas compostas. Enquanto tais, essas peças sinalizam a existência de uma tradição que, sem propriamente constituir uma escola, de certo modo encontra-se ancorada na cultura regional desses artistas que, não esqueçamos, apesar de não possuírem educação formal em arte, conviveram com um patrimônio artístico considerável. Não por acaso eles pertencem, segundo a crítica especializada, a um grupo seleto de mestres populares da escultura em madeira.


Percebem-se neles as marcas da inventividade de uma cultura híbrida, na qual o homem e a natureza, as dimensões espirituais e terrenas da existência, encontram-se em profunda simbiose. De certo modo, é quase impossível decifrar o sentido de suas composições sem conhecer o universo de referências que constituem as comunidades as quais pertencem. Como trabalhadores que dedicaram parte de suas vidas a lida no campo ou a ofícios manuais, e que no tempo livre participam das atividades religiosas comuns a diversas comunidades, com seus festejos e rituais, suas obras são impensáveis sem essa experiência. Vale dizer que diferentemente de algumas proposições muitas vezes carregadas de artificialismo da arte dita “contemporânea”, eles realizam de fato a continuidade entre a arte e a vida, entre indivíduo e coletividade, a ponto de restituírem sem proselitismos o potencial criador de todo homem.


É notável a destreza na maneira como cada um deles trabalha com a madeira em suas complexas peças. Os três esculpem a partir de blocos inteiriços que mesmo depois de entalhados conservam algo de sua forma original. O que a primeira vista pode parecer banal, mas que na verdade revela um sentido estético especial. Pois não é difícil imaginar o quão diferentes elas seriam se fossem constituídas pela junção de partes separadas, mesmo que perfeitamente encaixadas.


O que parece estar em jogo aqui é uma noção de unidade da e com a matéria, em que a madeira bruta é trabalhada a partir de formas que ela contém em si e sugere ao artista. Neste sentido, tudo no caso dessas grandes peças, do formato aos aspectos particulares da superfície, resulta de uma relação matuta entre o criador e seus monoblocos, numa relação de respeito mútuo.


***


Artur Pereira iniciou sua trajetória esculpindo em barro figuras isoladas de bichos. Nascido e criado em Cachoeira do Brumado, Minas Gerais, seu primeiro conjunto foi uma caçada e logo depois um presépio pequeno em cedro. A partir de então, passa a trabalhar nos blocos maciços de madeira macia complexas composições baseadas em sua experiência da vida rural.


Bichos, árvores, plantas, caçadores, vaqueiros, boiadas fazem parte do imaginário de suas esculturas compostas, cuja elaboração origina colunas vazadas e galhadas. Nelas reconhecemos o mesmo desenho sintético de volumes robustos e arestas arredondadas de suas peculiares figuras unitárias.


Em suas esculturas de conjunto, predomina uma integração quase total entre as partes do todo, mas sem que cada figura perca um forte sentido de individualidade, como mostra uma das pequenas colunas presentes na exposição. De um lado, seu ritmo espiralado em ascensão ordena o sentido da composição.


No entanto, para que alcance este efeito o artista não lança mão, como é comum a muitos criadores populares, de uma repetição infinita das mesmas partes. Ao contrário, ao caminharmos em volta desta peça, percebemos que uma face nunca é igual a outra e que neste concerto cada animal em sua singularidade possui um papel.


Sobretudo nas galhadas, há uma interessante variação no tamanho dos bichos, gerando a inversão da ilusão da perspectiva tradicional. Os felinos que se encontram no topo dos galhos são em geral estranhamente maiores do que os animais e seres humanos que se encontram na base, evidenciando uma estranha relação assimétrica altamente expressiva.


Neste sentido, pode-se afirmar que o universo encaixado² de Pereira conserva a abertura de múltiplos arranjos, revelando um olhar generoso que não buscava representar o mundo natural a partir de uma hierarquia estanque.


De maneira simples e singela, ele esclarece sobre a extrema unidade que orientava seu modo de proceder:


“Nunca aconteceu de eu terminar uma peça diferente do que pensei. Termino do jeito que veio na cabeça. Não modifico. Se vier outra coisa na ideia eu pego outra peça e faço aquilo que tô pensando, que veio na ideia. Mas aquela que eu comecei eu tenho que arrematar”.


Há nestas palavras tanto um noção de indivisibilidade da imaginação quanto da matéria, sendo que a primeira não pode se efetivar sem o concurso da segunda. No seu caso, escolher o bloco “errado” significaria colocar em risco a ideia imaginada, visto que sua concretização depende da completude e inteireza do fazer. Com sua inteligência arguta, Pereira vislumbra nas peculiaridades formais da matéria bruta, com seus troncos e suas ramificações, a possibilidade de novas composições que, ao mesmo tempo, mimetizam e recriam a natureza.


É também essa concepção de um mundo indiviso e simultaneamente múltiplo que parece animar as esculturas de G.T.O e Jadir.. Como artistas que desenvolveram seus respectivos trabalhos na cidade de Divinópolis, Minas Gerais, há em primeiro lugar uma proximidade efetiva entre eles que, diferentemente de Artur Pereira, costumam se dedicar com quase exclusividade a motivos religiosos – ainda que esses se constituam como uma mistura entre elementos do catolicismo, dos mitos indígenas e da cultura afro-brasileira.4


 Tendo iniciado sua carreira como escultor a partir de uma “revelação” em sonho, G.T.O. via na atividade artística uma espécie de missão divina . E na engrenagem peculiar que interliga os planos terreno e espiritual, a figura humana teria um lugar de destaque. Por isso, suas esculturas vazadas se formam a partir de uma rica trama humana que exprime uma visão de mundo cosmogônica na qual paraíso e inferno surgem como lugares em constante mutação.


A reincidência de determinados elementos em suas esculturas nos fazem acreditar no conhecimento, mesmo que inconsciente, de uma simbologia ancestral. A união de círculos – em si emblema poderoso do tempo e da completude, além de representar o mundo espiritual e os cosmos nas mais diversas culturas – é a estrutura marcante que caracteriza as peças de G.T.O. Vistas de longe, elas remetem às curvas e arabescos ornamentais de uma importante tradição oriental antiga que diante da proibição de representar seres humanos, foi capaz de jogar com todo um leque de padrões e formas decorativas inspiradas pelo mundo natural a fim de expressar a experiência do sobrenatural.


A meio caminho entre homens e linhas, a rede humana que preenche e liga as rodas vivas de G.T.O transmite aquela expressão de unidade que, de resto, é constituinte da espiritualidade do próprio artista. Mas cabe notar que também ele foge da ideia de absoluta simetria. Ao observar essas peças de ângulos diferentes, percebe-se uma variedade de posições e cenas que muitas vezes passam despercebidas ao olhar desatento.


Dentro de um estrutura até certa medida repetitiva, o artista dá forma a uma grande multiplicidade de acontecimentos. O que faz com que as delicadas esculturas vazadas de G.T.O. conservem uma poderosa força centrífuga, capaz de tencionar aquilo que poderia se transformar em uma totalidade por demais apaziguada.


No caso de Jadir algumas vezes a repetição hiperbólica de imagens semelhantes chega a comprometer a grandeza de suas peças. Entretanto, em geral o talhe seco e vigoroso recupera para a superfície de suas colunas compactas a potência enérgica e concentrada de sua ação. O corte adquire assim uma função plástica primordial., a medida que restitui para o observador a tensão criativa de seu fazer.


Como no caso de Artur Pereira e G.T.O., também ele produz seus trabalhos a partir de monoblocos maciços que são esculpidos igualmente de todos os lados, alcançando um jogo afinado de encaixes, cujo fundamento encontra-se na interdependência das partes do conjunto. No entanto, ao produzir menos espaços vazados do que os outros artistas, suas peças revestem-se da aparência pesada de esculturas monumentais.


O caráter hierático de suas obras, muitas vezes manipuladas em forma de relevo, indicam afinidades com os traços austeros da arte românica. Raramente Jadir trabalha a dimensão tridimensional das figuras. Por isso, apesar de lidar com a madeira, em alguns momentos sua matéria alcança a dureza e a resistência da pedra, material típico dos artistas daquele período.


Uma certa despreocupação realista permite que ele disponha as imagens, como fizeram aqueles primitivos artistas anônimos, a partir de intricados critérios simbólicos e ornamentais. Até certa medida, essa liberdade o emancipa da necessidade de imitar o mundo natural, habilitando-o a transmitir com mais vivacidade um sentimento dramático do sobrenatural. Taísa Palhares


¹Sobre a concepção de “mundo encaixado” na arte popular e seus desdobramentos para compreensão da obra de Artur Pereira cf. “Artur Pereira: uma natureza unificada e porosa” de Rodrigo NAVES (IN: Arthur Pereira – esculturas. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2009, p. 26).


² Apud Arthur Pereira - esculturas, op. cit., p. 107.


³ Segundo a pesquisadora Lélia Coelho Frota, "a grande repercussão da escultura de GTO, na década de 1960, estimulou outros artistas de Divinópolis a desenvolver e mostrar seu trabalho". Jadir transfere-se da área rural para a cidade em 1960, iniciando sua produção no final dos anos 1970, após um acidente que o impossibilitou de executar qualquer tarefa que requisitasse muita força física. Após algumas esculturas feitas em madeira de lenha com canivete, foi visitar GTO, que o ensinou a utilizar outras ferramentas (FROTA, Lélia Coelho. Pequeno Dicionário da Arte do Povo Brasileiro - século XX. Rio de Janeiro: editora Aeroplano, 2005, p. 245). Todas as informações biográficas citadas baseiam-se neste livro.


4 - Segundo depoimento do artista, ele já estava fazendo a escultura no "sonho", antes de realizá-la na madeira: "Depois do primeiro, continuei aí eu vinha sonhando tava fazendo o Cristo, aí fiz Cristo pregado na cruz. Fiz carregando cruz nas costas. Foi uma promessa que Deus me deu, eu cumpro" (apud FROTA, Lélia Coelho. Mitopoética de 9 artistas brasileiros. Rio de Janeiro: editora Fontana, 1975, p. 131).

RELEASE

Escultores mineiros: Artur Pereira, G.T.O. e Jadir João Egídio 


Os três artistas mineiros, Artur Pereira (1920-2003), Geraldo Teles de Oliveira – G.T.O. (1913-1990) e Jadir João Egídio (1933), estão reunidos nesta mostra que, por meio de aproximações e distanciamentos entre as respectivas produções, demonstra a singularidade destes mestres populares da escultura em madeira. Celebrados pela crítica, o trio comunga o virtuosismo do fazer e apurada sensibilidade plástica, atributos que podem ser conferidos nas 14 grandes peças reunidas na mostra. “Suas esculturas sugerem a intimidade de uma relação que se constrói a partir da observação contínua, lenta e acumulativa das coisas e do mundo”, afirma a curadora Taísa Palhares.


Apoiados na cultura regional, os três esculpem a partir de blocos inteiriços que mesmo depois de entalhados conservam algo de sua forma original. A relação homem e natureza, as dimensões espirituais e terrenas da existência, segundo Palhares, permanecem em profunda simbiose na expressão artística de cada escultor. “Como trabalhadores que dedicaram parte de suas vidas à vida no campo ou a ofícios manuais, e que no tempo livre participam das atividades religiosas comuns a diversas comunidades, com seus festejos e rituais, suas obras são impensáveis sem essa experiência [...] eles realizam de fato a continuidade entre a arte e a vida, entre indivíduo e coletividade, a ponto de restituírem sem proselitismos o potencial criador de todo homem”, comenta a curadora.


Artur Pereira nascido e criado em Cachoeira do Brumado (MG), iniciou sua trajetória esculpindo em barro figuras isoladas de bichos. Depois de ter esculpido um presépio pequeno em cedro, passa a trabalhar nos blocos maciços de madeira macia, complexas composições baseadas em sua experiência da vida rural. Bichos, árvores, plantas, caçadores, vaqueiros, boiadas fazem parte do imaginário de suas esculturas compostas, colunas vazadas e galhadas. Nelas se reconhece o mesmo desenho sintético de volumes robustos e arestas arredondadas de suas peculiares figuras unitárias.


Já G.T.O. (Itapecerica/MG) e Jadir (Divinópolis/MG), ao desenvolveram seus respectivos trabalhos na cidade mineira de Divinópolis, há uma proximidade efetiva entre eles. Diferentemente de Artur Pereira, “costumam se dedicar com quase exclusividade a motivos religiosos – ainda que esses se constituam como uma mistura entre elementos do catolicismo, dos mitos indígenas e da cultura afro-brasileira”, lembra Palhares.


Tendo iniciado sua carreira como escultor a partir de uma “revelação” em sonho, G.T.O. via na atividade artística uma espécie de missão divina. O artista – que participou da Bienal de São Paulo em 1969, 1971 e, em 1975 com sala especial, além da Bienal de Veneza em 1978 – coloca a figura humana em lugar de destaque na intersecção dos planos terreno e espiritual. “Por isso, suas esculturas vazadas se formam a partir de uma rica trama humana que exprime uma visão de mundo cosmogônica na qual paraíso e inferno surgem como lugares em constante mutação”, explica a curadora.


No caso de Jadir, em geral, o talhe seco e vigoroso recupera para a superfície de suas colunas compactas a potência enérgica e concentrada de sua ação. “O corte adquire assim uma função plástica primordial, na medida em que restitui para o observador a tensão criativa de seu fazer”, analisa Palhares. Segundo a curadora, ainda, o artista subtrai a imitação do mundo real e transmite em suas esculturas um “sentimento dramático sobrenatural”.  


Informações à Imprensa


Marcy Junqueira – Pool de Comunicação


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