Conheci Agostinho no início dos anos 90. Eu já tinha vários trabalhos seus na coleção, mas faltava conhecer o homem. Rugiero levou-o ao meu escritório e aquela figura baixinha, um pouco atarracada e com cara de poucos amigos, logo me interessou. Logo, ele passou a visitar-me e, de tempos em tempos, levava algum trabalho que eu comprava. Batíamos um papo, ele ia embora e eu ficava ali pensando que extraordinária a história, a vida e o trabalho daquele artista!Depois de sua morte a obra dele quase caiu no esquecimento. Nunca mais foi feita uma exposição, os trabalhos que aparecem nos leilões, mesmo os bons e com valor de compra baixo, nem sempre são arrematados. Essa é uma injustiça que não podemos mais deixar que aconteça. Esta exposição, a primeira desde sua morte, tem o objetivo de resgatar a memória e a obra de Agostinho Batista de Freitas. Não é uma retrospectiva nem pretende expor toda sua vasta obra. Fizemos um recorte selecionando os temas centrais em sua obra, o urbano, a roça e os folguedos populares, que julgamos ser o melhor e o mais surpreendente.
Vilma Eid
Agostinho Batista de Freitas | Direito á Poesia Exposição de 01 de outubro de 2008 a 01 de novembro de 2008 Curadoria João Grinspum Ferraz
Em algum momento, em meados do século XX, os olhos de críticos e marchands das artes plásticas brasileiras pareciam muito atentos a tudo aquilo que poderia surgir em lugares até então improváveis. Essa gente, que andava em busca dos impulsos criativos que definiriam uma produção cultural própria brasileira, retirava os seus olhos dos palcos tradicionais das artes plásticas - museus, salões e galerias - em busca de formas de expressão artística que pudessem emergir do povo sem passar pelo filtro academicista e elitista dos palcos tradicionais da crítica. Fora notável a descoberta de um pintor como Volpi que, de pintor de paredes, converteu-se em grande cânone da pintura nacional; ou mesmo da descoberta da pintura de Heitor dos Prazeres, nos anos de 1940 no Rio de Janeiro. Esses exemplos abriam as portas para que os observadores das artes pudessem reconhecer naquilo que havia de mais simples – e até mesmo precário – soluções artesanais riquíssimas, que poderiam traduzir a realidade, a expressão e o imaginário de grandes parcelas da população brasileira com maior autenticidade e precisão. Os marcos fundamentais dessa atenção em relação à produção artística popular brasileira foram as exposições “Bahia no Ibirapuera”, em 1959, e “A Mão do Povo Brasileiro”, em 1969. Ambas foram idealizadas pelo casal italiano Lina Bo e Pietro Maria Bardi, que havia chegado ao Brasil em 1946 e, por iniciativa de Assis Chateaubriand, haviam criado, em 1947, o Museu de Arte de São Paulo (MASP). Contrapondo-se à idéia de que existe uma arte “popular”, “primitiva”, “folclórica” ou “espontânea”, Lina e Pietro consideravam existir apenas a plenitude da expressão estética do homem, “que não mais admite divisões em categorias ou compartimentos estanques” E foi justamente Pietro Maria Bardi, diretor do MASP, que, em 1952 descobriu nas ruas de São Paulo – diz-se que no Viaduto do Chá – o trabalho de Agostinho Batista de Freitas, artista que vendia desenhos como forma de sobreviver. Já naquela época, chamava a atenção em sua obra o talento na representação das paisagens urbanas. Pietro fez-lhe a encomenda de uma pintura, deu-lhe tintas a óleo e tela e colocou-o sobre um edifício no centro de São Paulo. Dali, Agostinho pintou a vista da cidade de São Paulo, quadro que permaneceu com o “professor” Bardi até seus últimos dias. O “professor” Bardi via em Agostinho grande talento na composição de perspectivas urbanas e na captura de cenas cotidianas da cidade; chamava-o de o “Utrillo Brasileiro”, em alusão ao pintor francês Maurice Utrillo3, da Escola de Paris do início do século XX. Utrillo era um mestre em retratar as paisagens do bairro de Montmartre em Paris. Agostinho fazia o mesmo em São Paulo. Com o passar do tempo, Agostinho passou a retratar não só a cidade de São Paulo, mas também paisagens de outras cidades - de fazendas, da roça, de festas populares, bichos e plantas. Trabalhos que nos remetem à obra de Henri “Douanier” Rousseau4, pintor francês do final do século XIX e início do XX. Agostinho Batista de Freitas remanesce hoje como um observador atilado, e insere-se na linhagem direta dos grandes observadores da terra Brasil, aquela que vai de Franz Post e Carlos Julião até Alberto da Veiga Guignard. Agostinho não foi treinado nas técnicas clássicas da pintura: preparava suas telas e usava as tintas a seu bel-prazer. Mas fazendo tudo à sua maneira, foi um grande paisagista que conquistou, nas palavras de Lina, “o direito à Poesia”5.
João Grinspum Ferraz
A Galeria Estação exibe, com curadoria de Vilma Eid e João Grinspum Ferraz, a individual de Agostinho Batista de Freitas (Campinas, 1927 – São Paulo, 1997), artista descoberto nas ruas do centro de São Paulo, em 1952, por Pietro Maria Bardi, o então diretor do MASP - Museu de Arte de São Paulo. Direito à Poesia- Agostinho Batista de Freitas reúne 67 obras que, segundo os curadores, acercam os temas considerados os mais surpreendentes de seu trabalho: urbano, fazendas e festas. Agostinho compunha suas pinturas de maneira detalhada, porém simples, captando de forma excepcional cenas da vida cotidiana. Segundo Ferraz, o professor Bardi comparava o artista ao mestre em retratar as paisagens parisienses, Maurice Utrillo. Com o passar do tempo, porém, Agostinho passou a retratar não só a cidade de São Paulo, mas também outros temas, como fazendas, festas populares, animais e plantas. “Trabalhos que nos remetem à obra de Henri Rousseau, pintor francês do final do século XIX e início do XX.”, afirma o curador. Sem ter estudado técnicas de pintura, o artista representou o mundo a sua maneira e, através de uma arte não conceitual, tornou-se grande paisagista. Como diz Bardi, “ingênuo por natureza, simplificador festivo do que pinta, um mestre popular instintivo (...) Agostinho é o que é: um pintor”. Ferraz ainda completa: “Ele remanesce hoje como um observador atilado, e insere-se na linhagem direta dos grandes observadores da terra Brasil, aquela que vai de Franz Post e Carlos Julião a Alberto da Veiga Guignard”. Nascido em Campinas, Agostinho veio à cidade de São Paulo com 11 anos para trabalhar em uma fábrica de brinquedos na Mooca, da qual foi demitido por fazer desenhos no horário de trabalho. Depois de atuar como ajudante de eletricista, o artista passou a pintar e vender seus quadros na calçada da Avenida São João, no centro da cidade. Em 1952, P.M. Bardi passava por ali e se interessou por seu talento, “uma visão não abstrata, nem informal, nem concreta”. Segundo ele, Agostinho, desde aquele tempo, tornou-se seu amigo, e fez tudo o quanto pôde, com convicção, para o artista ser conhecido. “[Agostinho] esteve trabalhando, sempre atencioso, paisagista nato, sempre o mesmo manifestar genuíno”, escreve. A mostra dá continuidade ao trabalho do Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro (IIPB), - criado para preservar e promover a produção que emana do fazer artístico de origem popular brasileira -, e busca resgatar a memória e a obra de Agostinho. “Depois de sua morte, Agostinho quase caiu no esquecimento e esta exposição e o livro são uma forma de resgatar e fazer justiça a uma figura importante do cenário artístico brasileiro”, explica a curadora, presidente do IIPB e diretora da Galeria Estação, Vilma Eid. Na abertura da mostra, será lançado o livro Direito à Poesia- Agostinho Batista de Freitas, com textos de João Grinspum Ferraz, Pietro Maria Bardi e Roberto Rugiero, além de 64 fotos de obras, de João Liberato de Souza Vidotto e Luiz Hossaka.
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