Para encerrar 2021, vamos fazer uma conversa entre os artistas contemporâneos vivos da Galeria Estação e seus companheiros de acervo autodidatas, alguns vivos e outros não.
André Ricardo, pintor paulistano cuja exposição acaba de acontecer na galeria com grande sucesso, conecta-se com o baiano Alcides, também pintor, por cujo trabalho tem profunda admiração.
Germana Monte-Mór, pintora e escultora carioca, e José Bernnô encontram na pintura os pontos de aproximação.
Júlio Villani, paulista de Marília, com suas bricolagens construídas a partir de objetos garimpados em feiras e mercados em Paris, onde reside, e o escultor cearense Nino encontram no imaginário seu ponto em comum.
Martin Lanezan, artista argentino residente no Brasil, coloca nas suas pinturas em tecido a memória da infância no ambiente rural. José Antônio da Silva, pintor paulista de Salles de Oliveira, usa seu pincel para retratar os campos através de plantações, colheitas, pastos com boiada e muitos outros temas sobre a natureza com animais e personagens.
Moises Patrício, pintor e escultor paulista, explora o tema da religiosidade afro-brasileira e os ex-votos, tão característicos da cultura nordestina, encarnam o sincretismo brasileiro.
O xilogravador Santídio Pereira, piauiense, tão voltado para o diálogo com a natureza, identifica-se perfeitamente (além de adorar seu trabalho) com o escultor José Bezerra, morador do semiárido pernambucano, e suas esculturas trabalhadas a partir de troncos encontrados na mata.
Convidamos vocês a virem visitar esta exposição, que mostra a linguagem permanentemente inclusiva e sofisticada da Galeria Estação.
Vilma Eid
Baião de Dois
A Galeria Estação, desde sua abertura, em 2004, busca artistas curiosos para criar sua própria poética. Os artistas que trabalham conosco têm o poder de conversar indiretamente através de suas obras e, à medida que sua produção aumenta, vão se contando novas histórias.
Até 2016, nosso trabalho foi voltado majoritariamente aos artistas que começaram suas produções nos anos 70. Desde então, viemos a conhecê-los melhor e apreciar o trabalho de muitos artistas pouco escolarizados e em muitos casos sem educação formal alguma. Foram anos de trabalho, e infelizmente nem todos tiveram o privilégio de escutar os rumores resultantes da sua ópera e as distintas personalidades analisando cada um de seus atos.
Podemos perceber nas obras de hoje que artistas da nova geração bebem na fonte de seus antepassados, suas inspirações. Podemos concluir, portanto, que a nova geração artística tem uma base muito ampla, a ser explorada que vai lhes permitir usar essas cartas para produzir e obter resultados cada vez mais fascinantes.
Novos artistas estão construindo seu legado na cena artística. Eles têm um modo de exercer seu trabalho muito relacionado a como a cultura mudou nos últimos anos. Porém, vale lembrar que suas inspirações do passado trazem uma influência nos trabalhos atuais.
Ao olharmos minuciosamente para nosso acervo, chegamos a uma conclusão que nos pareceu promissora. Nossa ideia baseia-se em encontrar algo em comum entre dois artistas de épocas diferentes, trazendo para a exposição um olhar inesperado.
Vamos começar com André Ricardo, pintor cuja exposição acabou de acontecer. Paulistano criado na Zona Sul de São Paulo, conectando-se com o baiano Alcides. Ambos demonstram um desenho geométrico sobre tela, algo imensamente genuíno. Os dois nos chamam muito a atenção devido a sua mistura de coloração extremamente viva, que chega a hipnotizar os olhos daqueles que buscam distinguir o real e irreal em suas telas.
Germana Monte-Mór, vamos trazer ao lado José Bernnô, uma carioca ao lado de um paulista, os dois unidos pelo abstrato. Traçam linhas que se cruzam com a coloração interior da tela. Colocam em suas obras aquele mistério abstrato de livre interpretação, e é daí que vem a beleza da abstração: a liberdade do espectador para interpretar.
Julio Villani e Nino. O primeiro com seus ready mades (objetos industrializados, tirados de seus contextos, transformando-se em obra de arte), pássaros e animais construídos à base de achados em feiras e mercados em Paris. E Nino com peças de madeira traçadas cuidadosamente, para chegar em seus trabalhos de fazer cair o queixo. Apesar de representarem animais, nem sempre se atêm ao senso comum do que se espera, e isso os torna diferenciados.
Moisés Patrício explora a cultura negra e o candomblé, religião que adota de forma que o liberta e lhe permite explorar a tinta e a tela de um modo completamente revolucionário. Como seu trabalho se baseia em boa parte no contexto religioso, consignado ao candomblé, os ex-votos se encaixam como se fossem a última peça de um quebra-cabeça, pequenos retratos que seus donos, com muito cuidado, esculpiram em peças de madeira para agradecer por alguma promessa feita e pela graça concedida.
Para finalizar com chave de ouro, Santídio vai fazer parceria com José Bezerra. Santídio trazendo suas feições feitas em gravura com diferentes expressões, que são um enigma para os que as observa, o que torna seu trabalho ainda mais interessante. Zé Bezerra partilha do mesmo, com objetos de madeira, trazendo bichos e pessoas, e também temos que analisar minuciosamente cada peça para chegar a um veredicto.
Convidamos todos a visitar essa exposição particular que estamos montando e esperamos muito que gostem. Aqui, na Galeria Estação.
Pedro Philipp